terça-feira, 25 de outubro de 2011

Guerrilha do Araguaia e a memória social


Guerrilha do Araguaia e a memória social
                                                 
Os textos, documentos e iconografia a serem inseridos neste informativo eletrônico pretendem a socialização das informações. Para nós, os levantamentos e documentos até aqui conhecidos são suficientes para se chegar a outros cruzamentos de dados, estimula a troca de conhecimento para tentar avançar no quebra-cabeça imposto outrora pelo regime militar e hoje pela apropriação do que, entendemos, ser uma das mais belas - embora cruéis - páginas de nossa história.

A permanecer o vaivém de instalações de grupos de trabalho, comissões e outras aglutinações pessoais e de instrumento político, como já vimos nesses 20 anos e pouco, corre-se o risco de se perder - talvez definitivamente - os testemunhos orais, que sempre serão prova. E, mais do que a oficialidade da prova, eles constituem a narrativa principal, por guardarem a emoção dos que viveram os variados segmentos do conflito.

Começamos, assim, pela divulgação abaixo de fotografias, funções e períodos dos dois primeiros comandantes do 52° Batalhão de Infantaria de Selva (BIS), instalado no quilômetro 8 da Rodovia Tranzamazônica, entre Marabá e São Domingos, no sudeste do Pará.

Hoje, 25 de outubro, completam-se 39 anos do fuzilamento, segundo informações de ex-soldados, da última guerrilheira a ser aprisionada. A data foi informada em relatório entregue pelo então ministro da Marinha ao ministro da Justiça em 1993.

Essas informações coincidem, por exemplo, com o fac símile de delação de Walkíria, de 10 de outubro de 1974, publicada no livro A Lei da Selva, de Hugo Studart.

Apesar de Walk ter sido aprisionada e vista por militares e moradores ainda viva na Base de Xambioá, as indicações dos nomes dos comandantes do BIS, sem a alcunha de doutores, pode contribuir, no mínimo, para se tentar saber um pouco do que ocorreu durante a última das campanhas, a Operação Marajoara, da qual falaremos em outros momentos.
           

                            
Criado em junho de 1973 para combater as Forças Guerrilheiras do Araguaia (Foguera), o 52° BIS exibe todos os retratos de seus comandantes, incluindo os dois primeiros, com se observa na bainha das fotos.
O BIS também não esconde as razões de sua fundação, o combate ao “terrorismo”, segundo as inscrições da placa afixada no hall da entrada principal.


O 52° BIS integra a maior Brigada de Infantaria de Selva da América Latina, a 23º, com sede em Marabá. A Brigada, responsável pela logística do Grupo de Trabalho Tocantins, criado para cumprir parte da sentença da juíza Solange Salgado, responde pela área entre Imperatriz, no Maranhão, e Altamira, no Pará. A região, uma das mais ricas províncias minerais do globo terrestre, abriga o Polo Carajás, instalado a partir de julho de 1974, mês da morte da geóloga Dinalva Oliveira Teixeira, a Dina, segundo informa a Marinha.

Em 2005, Sebastião Curió Rodrigues de Moura revelou ao repórter Leonencio Nossa, de O Estado de S.Paulo, que a lendária Dina teria morrido no dia 24 de julho de 1974.

Nenhum passo da área dos direitos humanos - nem mesmo durante oitiva de Curió à Justiça Federal, em 2009 - foi dado para se saber mais do coronel que, ao estilo do agente britânico Kurtz, segundo ele próprio admite ser chamado em Brasília, impetrou por três décadas o coração nas trevas em área amazônica, tal como na obra homônima de Joseph Conrad, ambientada no Congo cem anos antes.

                              Antonio de Pádua Costa, Piauí, primeiro à esquerda, agachado

Preso em março de 1974, pelo atual tenente José Vargas Gimenez (Chico Dólar), o último comandante do Destacamento A da guerrilha, é “desaparecido”.

A fotografia, apresentada em 1996 por Paulinho Fonteles à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, foi encontrada pelo filho de um casal amigo dos guerrilheiros. Divulgada em jornais durante todos esses anos, nada foi feito para se obter mais informações.


46 – WALQUIRIA AFONSO COSTA  “WALQUIRIA”  (Dst B – Gp CASTANHAL)



    Valquíria, no álbum militar utilizado para identificar e combater guerrilheiros  – outubro 1972



Informações sobre Walkíria, segundo os relatórios das forças armadas de 1993, entregues pelos ministros militares em 1993 ao ministro da Justiça, Maurício Corrêa:

Walquiria Afonso Costa - Valquíria

Filha de Edwin Costa e de Odete Afonso Costa, nascida no dia 02 Ago 47, em UBERABA/MG.
Militante do PCdoB, utilizava o codinome “VERA”  e pertencia ao Destacamento  “B” do grupo Castanhal, liderado pelo guerrilheiro  “ZÉ FERREIRA”, na guerrilha do Araguaia.
Foragida, teve sua prisão preventiva decretada em função do IPM que apurou as atividades do Partido, na região do ARAGUAIA.
Consta que teria morrido em 1972, em confronto com as forças de segurança (Centro de Inteligência do Exército).

Militante do PCdoB, guerrilheira no Araguaia, dada como morta ou desaparecida por publicações diversas, da imprensa e de entidades defensoras dos Direitos Humanos. Neste Órgão, não há dados sobre o seu paradeiro (Força Aérea Brasileira).

- NOV/74, relacionada entre os que estiveram ligados à tentativa de implantação de guerrilha rural, levada a efeito pelo comitê central do PCdoB, em Xambioá. Morta em 25 OUT 74 (Marinha).


A Marinha fornece a data de morte de Walkíria assim como a de Piauí e da maioria absoluta dos que foram presos e “desaparecidos”, incluindo os capturados a partir de março de 1974, período do governo Ernesto Geisel.

Ainda em 2004, o ex-soldado Adaílton Bezerra fez questão, por exemplo, de se apresentar à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, para prestar depoimento sobre as horas em que passou de escolta, ou de guarda, para Walkíria, em Xambioá. E sobre os relatos que ouviu do médico daquela base militar. 

Tempos depois, ao observar a foto do prisioneiro Antonio de Pádua Costa, Adaílton disse que os militares, como poderia se observar na fotografia, poderiam estar formando a posição "meia-lua", utilizada para fuzilamento, a mesma que teria sido utilizada para Walkíria. Adaílton conta que oficiais chamados à base aguardaram o "Carrasco", autor dos três disparos que teriam atingido  a ex-estudante de pedagogia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

A única consequência da oitiva do ex-soldado que, antes de prestar depoimento, conversou com a única irmã de Walkíria, Valéria Costa, por telefone, a partir de Brasília, foi a violenta articulação de algumas militantes de direitos humanos, nos bastidores, para derrubar o então presidente da Comissão, João Luiz Duboc Pinaud. Para essas militantes, como ficou claro na época, ouvir militares não seria função, nem responsabilidade da comissão.

Alguns dias depois, por não aguentar a pressão, o antigo criminalista renunciou à presidência dessa comissão, instalada em 1995.  Segundo ele, é impossível trabalhar em direitos humanos no interior do aparelho de estado.

Trecho de relatório da pesquisa ao Grupo de Trabalho Tocantins (GTT) – Abril de 2011

As fotografias acima, conforme destacam as legendas, apresentam os primeiros comandantes do 52° Batalhão de Infantaria de Selva (BIS), criado, segundo o histórico da região, antes da terceira e última campanha militar contra as Forças Guerrilheiras do Araguaia.

O capitão Valder de Carvalho Lima comandou o BIS entre 1° de junho de 1973 e 30 de janeiro de 1975; o major José de Rosa Jr., de 30 de janeiro de 1975 a 6 de fevereiro de 1976. As fotografias ilustram a sala do comando atual do batalhão, junto a retratos de comandantes posteriores.

A sala, como se percebe, recebe visitantes civis. Pode-se afirmar, portanto, que o local é público. Registre-se que as fotografias, além de não serem secretas, mostram os comandantes conforme seus respectivos períodos de função.

O retrato do major Rosa, apesar de seu comando ultrapassar o tempo da guerrilha, foi acrescentado no trabalho desta pesquisa, pela dúvida de ele ter sido ou não um dos militares atuantes em período anterior.

O objetivo desta pesquisadora, ao pedir autorização para registrar os dois comandantes, durante os trabalhos de abril deste ano, é o de reforçar que muito do que se afirma a respeito da guerrilha, em especial do seu caráter “secreto”, não passa de mito, de lendas criadas para atender a outros objetivos, jamais à importância de a guerrilha tratar-se de um fato histórico, como outros da nação.


Para exemplificar melhor, as fotografias estão lá para quem quiser ver, com nomes, sobrenomes, funções e datas. Assim como são conhecidos relatórios militares da guerrilha, com nomes, sobrenomes e codinomes, a exemplo dos textos das operações Peixe, Papagaio, Sucuri, entre outras, já apresentadas em livros, sítios eletrônicos e outras publicações.

2 comentários:

Vanda Caldas disse...

Querida Miriam, o que vocês estão fazendo é uma grande contribução para que a verdadeira história do BRASIL seja contada. Só espero que nossa BRASIL continue sendo escrito pelos brasileiros,menos com "S" e não com z como estabelece o aculturamento.
Um abraço fraterno, Vanda Caldas

João Carlos Campos Wisnesky e Myrian Luiz Alves disse...

Olá, Vanda,

obrigada por sua mensagem. No interior do blogue Brasil está com s. Não entendo porque, na visualização da página nosso país aparece com z.
Vou continuar tentando.
Abraços,
Myrian