domingo, 4 de janeiro de 2015

Comissão que mente há 20 anos à sociedade, quer mais poderes - e dinheiro - do governo


                                      Myrian Luiz Alves e João Carlos Wisnesky*


Instituída em 1995 pelo governo Fernando Henrique Cardoso com o objetivo de “reparar” crimes do regime civil-militar de 1964-1985, a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos (Lei 9.140), sediada no Ministério da JUSTIÇA, em Brasília, quer, agora, poderes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), findada em dezembro de 2014.

Há quase duas décadas, essa comissão comete graves crimes contra a história do país, familiares de mortos e desaparecidos políticos e contra os próprios, ou melhor, contra seus corpos, configurando crime de vilipêndio, segundo o Código Penal.

Molesta túmulos, esconde esqueletos e restos mortais nas dependências da Secretaria de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República e impede o cumprimento (honesto) de duas sentenças judiciais contra a União.



FARSAS NA MEDICINA LEGAL

Com o absurdo de, composta por leigos, ter a responsabilidade de identificar militantes, desrespeitando instituições e laboratórios, a comissão em todo esse período não solicitou sequer fichas antropométricas. Quando flagrada em suas ilegalidades, como ocorreu no caso Bergson Gurjão Farias, em 2009, mentiu! Alegou “REVOLUÇÃO MITOCONDRIAL” para identificar, após uma série de denúncias na imprensa e na Câmara dos Deputados, o esqueleto com quase 1.90m e arcada dentária do primeiro guerrilheiro a tombar em combate com paraquedistas das forças legais. 

No poder da comissão, seus restos mortais (como ainda ocorre com os de outros companheiros seus), permaneceram ocultos de 1996 a 2009. Sua mãe (nonagenária), como seus irmãos, foi enganada antes, durante e depois desse período. Até hoje, como se pode comprovar nos documentos da SEDH e da CNV, nenhuma autocrítica relativa a esse descaso foi feita pela área de Direitos Humanos da Presidência.

Ao contrário, desde o início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, o tema “desaparecidos”, ou ditadura, foi utilizado de maneira jamais vista na história da redemocratização.

ESTUDANTE E GUERRILHEIRA JAZ NOS ARMÁRIOS DA JUSTIÇA

Este blogue alertou, em novembro passado, antes do final dos trabalhos da CNV, como tem feito desde sua criação, que havia – e há – restos mortais de guerrilheiros do Araguaia em poder da comissão de mortos e desaparecidos.

Entre outros, recolhidos em 1996 e 2001 da região do Araguaia, pela Secretaria de Direitos Humanos (SEDH/PR) e pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, está o de WALKÍRIA AFONSO COSTA, estudante de pedagogia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Walkíria, caçando em Minas Gerais e na sepultura, no Cemitério de Xambioá (TO), a 500m da Base Militar.
Intitulado E3.2, o esqueleto permanece sem providências de identificação desde 2001. 

Última guerrilheira a ser capturada, teria sido fuzilada na Base Militar de Xambioá (TO), na presença e por oficiais das Forças Armadas, em 25 de outubro de 1974.

O Relatório da Marinha, de 1993, já apontava a data, confirmada por inúmeros depoimentos ao Grupo de Trabalho Tocantins (GTT), criado pelo governo Lula, para cumprimento da sentença da Justiça Federal, em 2009. Objetivando, em primeiro plano, a condenação do Brasil pela Organização dos Estados Americanos (OEA), “ativistas” da luta armada urbana – que permanecem como se estivéssemos em guerra interna e que comandam as comissões - impedem o esclarecimento dos fatos e a identificação de “ossadas”, como a de Walkíria.

Pode-se, com base em pesquisas e fatos, concluir que, nos últimos anos, tais militantes do passado querem forçar a aceitação de seus métodos de ação – de caráter terrorista – pelas novas gerações, em detrimento da memória de guerrilheiros do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), militares para lá deslocados (há militares mortos em combate - quem são?) e a população.

É preciso lembrar – e debater – as divergências pretéritas dos grupos armados que resistiram, cada um ao seu modo, à ditadura. Incluem-se no debate partidos, que, embora clandestinos, não aceitavam a guerrilha urbana como ação de resistência, a exemplo dos comunistas do PCdoB, ou do PCB (que não aceitava também a rural).

No período Dilma Rousseff, a CNV forçou, via gigantesca assessoria, a versão dos grupos armados urbanos, obviamente para “enaltecer” o slogan (usado na campanha 2014) “Coração valente”.

Uma versão intensificada pela propaganda repetida quase diariamente pela mídia, por meio de releases, com histórias bastante conhecidas da historiografia. No fim, pouco revelou a CNV. Alguns documentos faziam parte do acervo do Arquivo Nacional. Outros, foram doados por militares às pesquisas e à imprensa. Pode-se afirmar que o relatório, divulgado com pompa, em 10 de dezembro - é apenas uma sistematização de livros e documentos públicos.

O caso Epaminondas Gomes de Oliveira, cujo esqueleto foi retirado do Cemitério Campos da Paz, em Brasília, era conhecido desde 1996. Faltou apenas, durante esse período, ação da própria Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos.

Pergunta-se: por que pagar custos dessa comissão ou aumentar seu poder?

O caso Bergson foi revelado por esta pesquisadora (Myrian Luiz Alves), com apoio de guerrilheiros – totalmente ignorados por essa comissão e pela CNV nos seus dois anos e sete meses de atuação –, amigos e jornalistas.

Em 2009, após vários anos de denúncia, foi preciso a intermediação do ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Pompeu de Matos (PDT), e do ex-ministro José Dirceu para retirar o corpo de Bergson do armário da SEDH, em 2009. Texto do Arquivo Nacional conta a identificação (devida) de Bergson (37 anos após sua morte, e 13 após seu sepultamento em campo santo em junho de 1972) e as dez ossadas em poder do Ministério da Justiça, sem encaminhamento.

Agora, o esqueleto de Walkíria e outros que jazem da mesma forma em caixas de papelão desde 2001 precisarão do apoio de quem do governo? 

Quem sabe o novo ministro da Defesa, Jaques Wagner?

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, registra-se, já tinha conhecimento do caso Bergson quando exercia seu mandato de deputado federal. Antes, portanto, de assumir a pasta no governo Dilma.

E a Secretaria de Direitos Humanos, no nosso entendimento, não teria qualquer interesse em resolver a questão. Para isso terá de assumir seu descaso e atos de vilipêndio.

Vamos repetir quantas vezes forem necessárias nossas denúncias contra a violência travestida de “direitos humanos” contra cidadãos e guerrilheiros (vivos e mortos) do Araguaia!

Grupo de Trabalho Tocantins (GTT), em 2009, na região de Brejo Grande (PA). Na imagem, Myrian,
 o general Araújo (de óculos), da Brigada Militar de Marabá, geólogos da UnB e legistas do IML-DF.


          * Myrian Luiz Alves é jornalista e pesquisadora. Participou de buscas e exumações na região em 2001, como assessora do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, advogado dos familiares do Araguaia. Foi pesquisadora independente convidada, por portaria, do Ministério da Defesa (2009-2012) para cumprimento da sentença da Justiça Federal. Em agosto de 2014, recebeu ofício da Presidência da República (Comissão Especial e SEDH) para “colaborar” com informações sobre essa “tal” guerrilha, como diz o texto do ofício. Há 14 anos denuncia a não-identificações, sob responsabilidade da SEDH, de guerrilheiros exumados do Cemitério de Xambioá (TO) e da Reserva Indígena Suruí, em São Geraldo (PA). 

*        * João Carlos, médico, foi guerrilheiro no Araguaia. Com o codinome "Paulo", integrou, entre setembro de 1971 e setembro de 1973, o Grupo 1, liderado por Orlando Momente (Landinho), do Destacamento A, então comandado por André Grabois (Zé Carlos). 

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Comissão que omite identificações quer mais poderes



na próxima semana, este blogue comENTARÁ O CASO.

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REDE BRASIL ATUAL 

Não ACABOU

Ao pedir mais poderes, Comissão quer investigação sobre mortos e desaparecidos da democracia

Órgão da Secretaria de Direitos Humanos reivindica atribuições da Comissão da Verdade para seguir investigando abusos do regime, ampliando alcance aos desmandos da polícia após redemocratização
por Tadeu Breda, da RBA publicado 06/11/2014 11:10, última modificação 06/11/2014 16:46
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REPRODUÇÃO
comissão especial
Comissão pede mudanças na legislação para ampliar o conceito de “vítimas do regime”
São Paulo – A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos quer “herdar” poderes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), cujo mandato expira em dezembro. Assim, terá mais condições de continuar investigando as graves violações de direitos humanos cometidas por agentes do Estado brasileiro durante a ditadura – tantas que dois anos e meio não foram suficientes para que os membros da CNV, nomeados em 2012, concluíssem o trabalho.
Criada por lei federal em 1995, durante o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e atualmente vinculada à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos também deseja que o país comece a investigar vítimas de execução e ocultação de cadáveres cometidas pelas forças policiais do país após a redemocratização, ou seja, entre 1988 e os dias atuais.
As ambições da Comissão Especial constam de uma carta de seis pontos com sugestões que gostaria de ver incluídas no relatório final da CNV, no capítulo destinado às “recomendações” para o Estado brasileiro. O texto será entregue aos comissionados na tarde de hoje (6). Entre as sugestões, o órgão pede ainda mudanças na legislação para ampliar o conceito de “vítimas do regime”, englobando pessoas que não participaram da resistência, mas, ainda assim, tiveram as vidas diretamente prejudicadas pela repressão, como os indígenas.
A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, que tem várias frentes de trabalho abertas no país, também reivindica  maior infraestrutura e orçamento para realizar as tarefas; a criação de uma Secretaria Nacional de Justiça de Transição para “consolidar a democracia no Brasil”; e maior participação de familiares nos trabalhos de busca e identificação dos mortos e desaparecidos políticos do país.

Documento

“É preciso insistir que a arquitetura da segurança pública é legado da ditadura civil-militar”, diz o texto enviado à CNV. “Hoje em dia, as vítimas privilegiadas da violência de Estado não são militantes de organizações políticas, mas jovens negros e moradores de áreas periféricas. Ao abandono social a que está condenada a maioria desses jovens, soma-se o desamparo institucional de suas famílias, que não conseguem conhecer a verdade sobre o que ocorreu.”
De acordo com a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, a extensão das investigações para o período posterior a 1988 se sustenta pela vigência, ainda hoje, do uso sistemático da tortura para obtenção de informações, da ocultação de cadáveres e dos índices “assustadores” de execuções sumárias encobertos pelos "autos de resistência seguida de morte."
“A continuidade da violência de Estado por meio da manutenção de estruturas repressivas herdadas da ditadura civil-militar impõe a criação de uma comissão especial sobre mortos e desaparecidos do período democrático”, sugere o documento.
Quanto aos poderes da CNV, a Comissão Especial quer absorvê-los para acessar todo tipo de informação pública, inclusive documentos sigilosos; convocar qualquer pessoa para entrevistas e testemunhos; determinar realização de perícias e diligências; promover audiências públicas; requisitar proteção federal aos que colaborem com as investigações; e estabelecer parcerias com órgãos nacionais e internacionais para intercâmbio de informações.
“O encerramento do período legal das atividades da CNV não pode ser considerado, em hipótese alguma, o término do trabalho de apuração das violações de direitos humanos ocorridas durante a ditadura civil-militar brasileira”, argumenta o texto. “O relatório final da CNV deve fortalecer as frentes de trabalho já existentes, além de criar demandas, em razão da apresentação de novos fatos e testemunhos que, certamente, precisarão continuar a ser investigados.”

Razões

De acordo com Eugênia Gonzaga, procuradora da República em São Paulo e presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o grupo já devia ter sido criado com as prerrogativas que agora reivindica. “A experiência da CNV mostrou que esses poderes foram imprescindíveis para a condução dos trabalhos, que não terminaram e têm que prosseguir”, ressalta. “Para que possamos prosseguir, precisamos desses poderes.”
Antecipando críticas, Eugênia lembra que a Comissão Especial foi criada por lei. “Somos uma comissão de Estado, não de governo”, sublinha. “Podemos ser considerados a primeira comissão da verdade criada no país.” A procuradora lembra, porém, que o grupo possui infraestrutura tímida demais para as atividades que desempenha. “Não temos previsão orçamentária e nosso quadro é muito pequeno diante do trabalho que exercemos.”
A presidente da Comissão Especial argumenta que investigar os crimes cometidos pelo Estado durante a democracia é uma questão de manter padrões éticos nas instituições policiais. “Não que não haja ética, mas a certeza da impunidade faz com que abusos continuem acontecendo.” Eugênia lembra como o anúncio de que autoridades submeteriam a perícia os corpos de pessoas mortas pela PM de São Paulo, em 2006, após ataques do PCC, reduziu o número de vítimas. “Combater a possibilidade de desaparecer com as pessoas é uma necessidade importante.”

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Coração valente, uma ova!

Restos mortais de guerrilheira do Araguaia mineira fuzilada em 25 de outubro de 1974 em base militar no norte do Tocantins estão há 13 anos nas mãos dos direitos humanos da Presidência da República.

Paralisamos este blogue quando foi criada a Comissão Nacional da Verdade para observar até onde poderiam ir os fascistas que sequestraram a história recente do país.

                                 Myrian Luiz Alves e João Carlos Wisnesky

A pesquisa a respeito de mortos e desaparecidos, desenvolvida nos últimos 13 anos, mostrou que não há limite para quem os meios justificam os fins e vice-versa.

Com uma história frágil nos últimos 30 anos, a atual candidata-presidente e seu grupo mais próximo, optaram por tirar a história de outros, como a de combatentes contra o regime militar nas matas do Araguaia (1972-1975).

Simplesmente porque dela - dessa história - havia processos na Justiça brasileira e na Organização dos Estados Americanos (OEA), tão combatida anteriormente pela esquerda armada, como registra a vida de um dos amigos da presidente, Carlos Alberto Soares de Freitas.

Para melhor sustentar-se na mentira atual, esses que se dizem "direitos humanos" esconderam restos mortais enterrados em campo santo por militares em Xambioá (TO). 

Desde 1996 e 2001, estão omitidos – ou escondidos – em Brasília, por esses mesmos grupos , que hoje aparelham, e antes enganavam o Estado, e pela Presidência da República, para sustentar a versão “coração valente”.

Coração valente tinha a mulher que foi fuzilada na base de Xambioá em 25 de outubro de 1974. Sábado, serão 40 anos de enganações! Treze em mãos que se dizem "companheiras".

Estudante de pedagogia da UFRJ, Walkíria Afonso Costa foi a última guerrilheira do PCdoB a ser presa e morta.

Como já apontavam relatório apresentado pelo ministro da Marinha em 1993 ao Ministério da Justiça, o mesmo ministério que, atualmente, ajuda a ocultar seus restos mortais, não permitindo sua identificação.

Lesa-pátria e imoralidade explícitos.

E com as comissões da “verdade” tentam lavar o cérebro da juventude atual.

Como mostraremos em outro texto.

Porque há outros restos mortais em poder dos que saqueiam a história e o patrimônio do Brasil!

Informações da Marinha do Brasil, em 1993

- NOV/74, relacionada entre os que estiveram ligados à tentativa de implantação de guerrilha rural, levada a efeito pelo comitê central do PCdoB, em Xambioá. Morta em 25 OUT 74 (MAR).














segunda-feira, 23 de julho de 2012

MPF vê incompetência na busca por desaparecidos políticos


O Estado de S.Paulo - 23 de julho de 2012 | 10h 07

ALANA RIZZO - Agência Estado

O Ministério Público Federal (MPF) acusa a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos e a Secretaria de Direitos Humanos de omissão e improbidade administrativa por conta de falhas na localização e identificação de restos mortais. O documento, a que a reportagem teve acesso, foi encaminhado à Comissão da Verdade.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foi cobrado pelos integrantes da Comissão da Verdade sobre a atuação do Núcleo de Pesquisa em Identificação Humana para Mortos e Desaparecidos Políticos da Polícia Federal. Desde 2010, a PF trabalha em parceria com a Comissão de Mortos nas atividades de busca e identificação dos corpos.

Ofício encaminhado ao Ministério da Justiça pelo coordenador da Comissão da Verdade, Gilson Dipp, pede esclarecimentos sobre o estágio dos trabalhos nos casos citados pelo MPF e os resultados obtidos na definição da identidade de ossadas.

Segundo o relatório dos procuradores da República, a inércia e a ineficiência da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos da Secretaria de Direitos Humanos teriam chegado a limites insustentáveis.

"Inicialmente o MPF atribuiu a dificuldade em obter avanços na matéria à carência de recursos humanos e materiais da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos", diz o texto. Em seguida, porém, a omissão da comissão e da secretaria abriu espaço para considerar a existência de responsabilidades pessoais pela violação de direitos fundamentais.

Improbidade

"As ausências de respostas aos ofícios, às recomendações e notificações chegam às raias da improbidade administrativa, salvo melhor juízo. Após mais de 10 anos de atuação do MPF na matéria, é possível afirmar que a secretaria e a comissão não realizam suas obrigações legais de ofício. E, mesmo quando provocados pelo Ministério Público Federal, tergiversam", diz a conclusão da procuradora Eugênia Augusta Gonzaga.

Ela cobra ações imediatas perante a secretaria e a Presidência da República. O documento, intitulado "Relatório para Fins de Prosseguimento nos Trabalhos de Busca e Identificação de Mortos e Desaparecidos Políticos no município de São Paulo", é assinado também pelo subprocurador-geral da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Aurélio Veiga.

Os procuradores listam procedimentos administrativos e ações civis públicas em tramitação na Justiça de São Paulo sobre o tema. Detalham ainda as dificuldades encontradas na localização dos mortos e desaparecidos políticos nos cemitérios de Vila Formosa e Dom Bosco, no bairro de Perus.

Na avaliação dos procuradores, a situação no cemitério de Vila Formosa é dramática. "Imagina-se que não haverá alternativa senão a construção de um memorial para registro dos fatos. É praticamente impossível a localização de uma ossada específica, inumada ali como indigente há mais de 40 anos, como ocorria com os militantes políticos." O cenário não seria muito diferente no Dom Bosco, que alterou critério de identificação das covas.

O documento ressalta que ossadas (cerca de 1.049) separadas em 1990 permanecem desde 2001 no Cemitério do Araçá. Não foram até hoje examinadas por quaisquer das sucessivas equipes que atuaram nos trabalhos de identificação.

O MP especifica casos de militantes políticos, como Hiroaki Torigoe, que, apesar das indicações das ossadas, não teria entrado na pauta da comissão, e Luiz Hirata e Aylton Mortati, cujos restos mortais aguardam a finalização de exames antropológicos e de DNA, prometidos desde outubro de 2010.

Secretaria

A Secretaria Especial de Direitos Humanos informou ontem, por meio de sua assessoria de imprensa, que não recebeu o relatório do MPF sobre omissões no trabalho de localização e identificados de desaparecidos políticos.

No mesmo comunicado, a secretaria ressaltou que a busca de respostas para os familiares dos desaparecidos é uma prioridade e que conta com a contribuição da sociedade, do MPF e da Comissão da Verdade para melhorar os trabalhos.

Marco Antonio Barbosa, presidente da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, também citada no relatório do MPF, informou que, por enquanto, não iria se manifestar. "Desconheço o texto e só posso comentar após tomar conhecimento", disse. As informações são do jornal O Estado de S.Paulo.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Coluna Bastidores


Bastidores

Por Myrian Alves e João Carlos


Como mostra a legenda da foto, o capitão comandou o 52º Batalhão de Infantaria de Selva (BIS), implantado no Km 8 da Transamazônica em junho de 1973 para combater a guerrilha. Do BIS foram retirados corpos, segundo testemunhos ao Grupo de Trabalho Tocantins, em 2010. Já faz parte da narrativa da história. 

O período da chefia do capitão coincide com o da eliminação de prisioneiros. Ele poderia contar o que ocorreu, pelo menos entre Brejo Grande e Marabá (PA). Fotos dos sucessores integram também a homenagem  aos comandantes do BIS da 23ª Brigada, a maior da América Latina. (Relatório e foto de Myrian Luiz Alves, GTT, abril/2011)


Comissão da Verdade prioriza documentos 
antes de novos depoimentos

A informação saiu anteontem (26) no Correio Braziliense. A notícia é boa. Um bom cruzamento de informações pode impedir a repetição da divulgação de assuntos velhos como fossem novos. Foi o caso da entrevista do legista Harry Shibatta, um dos campeões de laudos de mortos políticos durante o regime militar.

Profissão "terrorista"

Durante os anos de chumbo, o IML paulista inscrevia a profissão "terrorista" nas fichas dos que morriam em conflito armado, nas ruas ou nas torturas dos porões. Quando não retirados por parentes ou outros, pelos mais variados motivos, o serviço funerário municipal de São Paulo encaminhava os corpos para cemitérios municipais, com seus nomes verdadeiros ou falsos. A partir de março de 1971, o Cemitério dom Bosco, no bairro de Perus, passa a receber a quase totalidade dos que tombavam nessas condições.

Tudo isso foi apurado há 20 anos pela Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Desaparecidos Políticos (CPI de Perus), da Câmara paulistana. Shibatta e vários de seus colegas, como Isaac Abramovitz, depuseram em audiências públicas, como fizeram também ex-governadores, ex-delegados e militares como o falecido coronel Eramos Dias.

Quebra-cabeça 

A documentação do IML foi pesquisada durante a CPI graças a trabalho  anterior do repórter Caco Barcelos, ao levantar informações para seu livro Rota 66. Ou seja, os documentos, em desordem, foram arrumados pela equipe do jornalista. Representantes de direitos humanos e assessores da CPI também cruzaram essas informações, disponíveis nas 19 pastas da comissão no acervo da Câmara paulistana. Casos de outros estados também foram tratados na CPI, entre eles o Araguaia.

Por que é considerado "desaparecido" um corpo que dá entrada num instituto de segurança pública, é fichado e encaminhado para cemitério municipal? Ou, ainda, visto pela maioria da população de uma cidade do interior, que vivia e sabia tratar-se de uma guerra.

Vez ou outra volta à pauta a destruição de documentos. Até mesmo o visado IML de São Paulo mantinha, em 1989, 90 e 91 todos os seus registros e disponibilizava suas desorganizadas pastas a um repórter da TV Globo, devidamente autorizado pelo governo do estado.
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A casa de Petrópolis

Os representantes de direitos humanos do Rio precisam se entender sobre a questão dos mortos da casa de Petrópolis. Os militantes foram desaparecidos, como diz o ex-delegado Claudio Guerra, ou foram enterrados no cemitério da cidade, como já noticiou tantas vezes a imprensa. 
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Maluf e Perus 


A  fotografia do ex-presidente Lula com Fernando Haddad e Paulo Maluf, que correu as redes nos últimos dias, serve pelo menos para lembrar que o ex-prefeito pode ser útil à Comissão da Verdade.

Quem sabe, agora, o "comunista" Maluf resolva ampliar as informações dadas à CPI de Perus, em 1991. Na época, o vereadores queriam apenas saber a razão do campo santo ter sido construído às carreiras, sem serviços adequados até de terraplenagem.

A partir de março de 1971, o Cemitério Dom Bosco receberia a maioria dos mortos políticos de São Paulo.


Maluf prestou um grande serviço ao regime, ao comprar, por exemplo, às custas do erário, todas as homenagens - coroas de flores, placa de bronze, divulgação em jornais - à jovem agente Stela Borges Morato, assassinada (como mostrou a CPI) em "fogo amigo" no cerco ao líder da Ação Libertadora Nacional (ALN), Carlos Marighella, em 4 de novembro de 1969. 

A morte de Stela também deve ser esclarecida para a história do país. 

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Grupo de Trabalho Araguaia, junho/2012



Ficou bonita a inserção do Brasão da República nos impressos do GTA, incluindo os utilizados nos veículos que percorrem a região para o cumprimento da sentença federal.

Em 2001, recortei os símbolos republicanos de várias pastas da Câmara para colá-los nas laterais das caixas de restos mortais que seguiram de Marabá para Brasília, após a primeira fase da Expedição Antígona, da Comissão de Direitos Humanos.

Naquele momento, também os três poderes atuavam na apuração dos acontecimentos da guerrilha no Araguaia. A Comissão da Verdade pode nos fazer entender as razões da condenação do Brasil na Corte Internacional. (Myrian Alves)

domingo, 27 de maio de 2012

ASCO



Myrian Luiz Alves e João Carlos Campos Wisnesky


Aos guerrilheiros Lucia Maria de Souza (Sonia) e
 Libero Giancarlo Castiglia (Joca), in memoriam

(Liubliu – Amo, de Wladmir Maiakovski)

“(...)  Depois
atai-me a um poste
fuzilai-me!
Por causa disso
Haverei de mudar? (...)”

(Guerra e Paz – Maiakovski. Tradução: E.Carrera Guerra, 1956)


Desde a confirmação dos sete indicados pela presidente Dilma Rousseff à Comissão da Verdade, ou, desde sua instalação, somente agora os autores deste blogue decidiram tecer sua opinião, ou comentários. Optaram por observar as análises e as polêmicas publicadas nos mais variados meios de comunicação. O resultado dessa leitura é estarrecedor! E, também, sugestivo!

Quantas opiniões vieram à tona para apontar que a Comissão deve fazer isso ou aquilo, que esse ou aquele não deveria integrar o seleto grupo, como se pode observar na entrevista da representante do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, em entrevista à Carta Maior.
 
Haverá um dia em que todo o cinismo desses chamados representantes de "direitos humanos" será finalmente revelado. Por ora, nossa obrigação é a de apenas lembrar-vos, amigos leitores, que essas pessoas calaram-se diante da revelação de corpos de combatentes em armários da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos. Algumas foram, inclusive, responsáveis pelo "arquivamento.

Ao ser um dos corpos identificado, 13 anos após sua exumação por um grupo forense argentino, sob a tutela de tal comissão, essas pessoas também não fizeram autocrítica. Apoiaram-se na absurda desculpa de que uma “revolução mitocondrial” favorecera a identificação de um homem com quase 1.90m de altura, problemas na mastoide e 21 dentes (sete teriam ficado na terra), além de materiais, como restos de cipó, com ele encontrados. Não permitiram a legistas ou laboratório brasileiros a análise dos restos mortais.

Não demonstraram nenhuma comiseração por sua mãe, nonagenária, ter ficado mais de uma década sem poder sepultar dignamente seu filho, morto no enfrentamento a paraquedistas e em defesa de quatro camaradas, no final de maio ou nos primeiros dias de junho de 1972 (provavelmente no dia 2 de junho). Bergson Gurjão Farias, Chefe do simbólico grupo chamado Esperancinha não foi assassinado. Morreu em combate.A revelação de mais uma identificação de guerrilheiro do Araguaia, enterrado em cemitério público, e retirado em 1996 com apoio governamental, poderia, afinal, prejudicar a ação movida na Corte Interamericana contra o Brasil. 

Isso, em nosso entender, além de nos envergonhar enquanto nação demonstra o mau-caratismo que tomou conta de muitas organizações no país, e, também, das instituições. Nem o fascismo ou o nazismo teria sido tão criativo.

Omitir cadáveres dentro do aparelho de estado para usufruir de status político e financeiro por meio dos direitos humanos não provoca asco? Apoiado pela Comissão Europeia, nenhuma ação política para sabermos melhor o que se passou durante o regime militar satisfaz esse grupo e outro assemelhado, do qual sempre falamos, ambos com menos de meia dúzia de porta-vozes. O que eles querem?

Os jornalistas que os entrevistam não percebem o cinismo - seus desentendimentos internos quando lhes convêm, e sua união quando o tema é indenizações ou nomeações à vista?

Há mais restos mortais retirados da região do Araguaia em Brasília, que, identificados, auxiliariam a localizar outros que ainda lá permanecem. Guerrilheiros podem ter sido mortos na Capital, pois para lá foram levados com vida, como revelou um sargento da Aeronáutica na Comissão Externa da Câmara dos Deputados em 1992 (texto da Agência Estado abaixo).

Queremos saber dos responsáveis por essas prisões o que ocorreu. É preciso ouvi-los e cruzar suas informações com os milhares de documentos já disponíveis e outros que possam ser revelados pela Comissão da Verdade.

O que temem os vampiros de nossa história? De também eles serem cobrados por suas omissões? De seus financiamentos recebidos do exterior, como a Fundação Ford, para publicarem livros bem grossos – são mais caros, claro – com historinhas sempre por eles próprios contadas?

Não querem, também, que saibamos de erros ou equívocos de seus líderes? Ou por que entendem que os contrários às suas opiniões devam ser justiçados, retirados da vida pública por conta de suas queimações?

Queremos ouvir o Brasil tal como ele foi forjado, analisado sob o contexto mundial do período e de seu processo de redemocratização. Sem medos ou vergonha.

Se a história da civilização fosse tratada como desejam os vampiros de nossa história, assassinos ou os que (re)escondem corpos de suas verdadeiras famílias, não conheceríamos sequer o que se passou em Troia ou em Waterloo.

Queremos, além disso, saber as divergências políticas e de ação entre os grupos que foram à luta armada, seus reais objetivos, da mesma forma que já se sabe o papel do Brasil no apoio a outros golpes militares, como o do Chile.

E, mais a fundo, também solicitamos à Comissão da Verdade uma análise sobre o dossiê elaborado pela senhora Maria de Lourdes Salazar e Oliveira à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos, em 22 de janeiro de 1996, para saber dos restos mortais de seu filho, Ciro Flávio Salazar e Oliveira, tombado em 30 de setembro de 1972, com seus companheiros Manuel José Nurchis e João Carlos Haas Sobrinho.

Aliás, queremos saber o que se passou no Instituto de Criminalística do Distrito Federal (ICDF) e na Polícia Federal de Brasília em 19 de novembro de 2003, dia em que restos mortais e coletas de sangue foram estupidamente retirados para serem arquivados na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos. Junto ao material coletado da família Haas, no ICDF, havia um osso da perna de Iuri Xavier Pereira, jamais desaparecido. Por que estava ali?

Um bom caminho para saber os procedimentos sob a responsabilidade de leigos autointitulados especialistas em ”direitos humanos” é ouvir, por exemplo,  legistas e antropólogos de Brasília, da Argentina e da Unicamp. E conhecer, também, detalhadamente seus relatórios e saber, ainda, “resultados” divulgados pela Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos a partir de análises jamais apresentadas.

“(...) Em nossas veias/corre um sangue rubro/E não água morna .
Marchamos através/de um ladrar de balas/para que ao morrer
nos tornemos/navios/poemas/ou coisas maiores.
Gente como eu/Jamais deveria morrer.
Mas, já que existe um fim/quisera/ – É meu único desejo –/encontrar a morte/
como a encontrou /o camarada Nette.”

(Maiakovski – Ao Camarada Teodoro Nette – Homem e Navio, 1926)


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Reportagem da Agência Estado, de 9 de dezembro de 1992, relativa a depoimento de ex-sargento da Aeronáutica à Câmara dos Deputados

"Diário do Passado
Quarta-feira, 9 de dezembro de 1992
Sargento depõe sobre o Araguaia na CPI dos desaparecidos políticos
Brasília, 09 (AE) – Os deputados Roberto Valadão (PMDB-ES) e Cidinha Campos (PDT-RJ) tomaram ontem, em nome da CPI dos Desaparecidos Políticos, o depoimento do sargento reformado da Aeronáutica, Napoleão Sabino de Oliveira. Ele diz ter transportado guerrilheiros presos na guerrilha do Araguaia.
Seu relato durou quase uma hora. Diante do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcelo Lavenere, o sargento contou que, de 1974 a 1975, trabalhou no transporte de alimentos e pessoas entre Brasília e Xambioá, no Araguaia.
Em janeiro de 1975 ele transportou oito guerrilheiros encapuzados – cinco homens e três mulheres – de Xambioá para Brasília. No percurso, um deles perguntou se ia morrer. “Nesse avião, não”, teria respondido o sargento.
Ele contou também que muitos guerrilheiros assassinados foram enterrados num local situado a 1.500 quilômetros (sic) da pista de pouso de Xambioá, mas ressalvou não ter testemunhado nenhum desses crimes. O sargento responsabilizou o Exército e a Aeronáutica por essas mortes; e as polícias militares do Amazonas e do Pará, como sendo as forças deslocadas na época para o Araguaia."
(Trecho de relatório de Myrian Luiz Alves ao Grupo de Trabalho Tocantins (GTT), março de 2011)

terça-feira, 8 de maio de 2012

Dr. Juca, em quadrinhos, e a importância do registro histórico



"Nem todos os anos que passam se vivem: 
uma coisa é contar os anos, outra é vivê-los."
(Padre Antônio Vieira)

Myrian Luiz Alves



Manobras militares da Operação Papagaio (setembro-outubro de 1972) em Caiano, em área da propriedade do economista gaúcho Paulo Mendes Rodrigues, primeiro comandante do Dst C da guerrilha. Juca viveu certo tempo na "fazenda", e ali manteve uma farmacinha. O senhor Cícero da Bella lembra-se do jeito de Juca fazer café, aproveitando água quente para escoar copos e xícaras. O Grupo de Trabalho Tocantins gravou relevantes depoimentos a respeito do doutor Juca. Reunidas todas as informações até aqui, o médico nascido há 71 anos em São Leopoldo, presidente da União Gaúcha dos Estudantes em 1964, ano em que se formou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, contribui para que essa página da história integre o ensino de história do país desde o fundamental.  Caiano, às margens do Rio Araguaia, localiza-se em São Geraldo, no sudeste do Pará. Guarda um dos mais fortes e simbólicos registros da memória regional. A foto integra o acervo do ex-soldado Raimundo Pereira de Melo, fundador e dirigente da Associação dos ex-Combatentes da Guerrilha do Araguaia. Nas manobras militares,  a base de Caiano era composta, em sua maioria, por soldados vindos de Minas Gerais.

Legal a proposta do blog criado por Taís Morais, jornalista, escritora, pesquisadora da Guerrilha do Araguaia e da história recente do Brasil. Ótima contribuição ao acompanhamento do vaivém da atuante Comissão da Verdade, embora até o momento a presidente da República Dilma Rousseff não tenha nomeado seus integrantes. 

Surpresa, também, conhecer, pelo blog, o bonito trabalho postado no Youtube, o dr. Juca (João Carlos Haas Sobrinho) em quadrinhos.

Como sabemos, infelizmente, que a hipocrisia atrasa o contar das histórias, ficamos contentes quando conhecemos novos trabalhos relacionados ao tema. Pois sabemos, por outro lado, que podemos confiar nos condutores do (re) contar. Juca é um deles. O que se passa, né, Taís?

Dr. João Carlos, no Vão do Marco, entre Porto Franco e São João do Paraíso (MA), com o Frei Ângelo e moradores. Abaixo, discurso de Fortunato Pereira Neto, Poeta do Sertão, declamado na despedida do primeiro médico cirurgião de Porto Franco, em meio a 3 mil pessoas, tendo a à frente o então bispo de Tocantinópolis e autoridades locais. Manifestação para o convite a que permanecesse na cidade. Deve-se o arquivo da memória do sul maranhense, em especial, ao secretário de Cultura de Porto Franco, Vaner Marinho e moradores que guardaram lembranças do jovem médico, morto aos 31 anos durante a Operação Papagaio, 
ação das três forças militares, na qual tombaram oito guerrilheiros. 


Da Memória Sul Maranhense

"Discurso do poeta imortal, Fortunato Moreira Neto, quando do histórico ato público da população de Porto Franco e região, na tentativa de evitar a partida do Dr. João Carlos.

Ilustres Ouvintes:
Nobres concidadãos aqui presentes:

Na reunião popular de ontem, fui surpreendido para fazer uso da palavra. Então, falei, não porque me sentisse em plenas condições de fazê-lo, mas, circunstancialmente, para dar um simples haver num grande débito de gratidão. Creio, porém, que o crédito mais aumentou a importância do débito, o qual sempre há de ficar acima de todos os pagamentos! E aqui me encontro por causa de tal dívida, por cujo motivo me cumpre dirigir-vos, em inculta linguagem, expressões e pensamentos, em referência aos elevados e honrosos objetivos desta impotente e cordial manifestação de apreço, e condignamente feita, agora, ao Dr. João Carlos, eminente médico e super-homem que, a serviço do bem, há tempos se encontra entre nós, como nobre benfeitor da humanidade.
Ora, sabemos que a arte de falar bem – a mais difícil de todas as artes , é sublime privilégio de raros homens chamados gênios, entre os quais posso citar:  Demóstenes, na Grécia; Cícero, na Itália;  Dr. Joaquim Nabuco de Araújo; Dr. Rui Barbosa, o Padre Antonio Vieira (o Crisóstomo); Monte Alverne e mais outros do Brasil; e todos de renome sobejamente conhecido da História da Civilização ou na História Universal.
Quisera, meus amigos, ter o divino dom da Oratória, e para vos dar uma inconcussa prova de leal amizade e de consideração, neste instante, e sobre o assunto em foco, e que ora tanto nos empolga e prende a atenção, e por justas  razões.
Um simples palpite de minha parte quero juntar às vossas mais queridas aspirações, e que deram ensejo a esta segunda reunião coletiva e seleta, e que significa a continuação dos nossos melhores anseios pelo completo bem estar e felicidade do bom e heróico Povo da nossa querida Cidade!
Eis o meu singelo modo de pensar a respeito da crescente e prosperidade que desejamos a Porto Franco e à nossa heróica gente e do sertão.
Primeiro que tudo, devemos apelar para a Suprema Vontade da Providencia Divina, que trouxe o Dr. João Carlos ao nosso modesto convívio, e para que tão douto e generoso médico prossiga conosco, como preciosa dádiva do Céu a todos nós, e ante as nossas dores e sofrimento; segundo, continuarmos constantes no apelo que lhe estamos fazendo e para que fique conosco, como bem lhe aprouver, ou for conveniente a seus próprios interesses, e de modo que Deus sempre abençoe a sua honrosa estadia em nosso meio-ambiente.
Creio ser de nossa absoluta necessidade termos aqui uma importante Junta Médica, e que lute, abnegadamente e incessantemente, no sentido de salvar-nos das doenças, e sob o patriótico amparo da Bandeira do Brasil, heroicamente e hasteada ou desfraldada entre os suaves e harmoniosos acordes do Hino Nacional a nosso favor.
Da Junta Médica em pálida e obscura sugestão de um rude Mestre-Escola do Sertão, o Dr. João Carlos poderá ser o erudito Diretor ou Dirigente, tendo o necessário tempo para acompanhar a evolução da Medicina Moderna ou da Ciência Médica atualizada; e para inteira felicidade dos pacatos habitantes de Porto Franco, e de quaisquer outros lugares que procurarem os relevantes serviços do seu conceituado Consultório Médico bem esse que nos seja logo e inadiavelmente dado pela atual Administração do País, em nome de Deus, e para maior Glória de nossa Pátria estremecida.E, assim, Dr. João Carlos, mais um mínimo haver no insolvível débito de gratidão que tenho convosco.
                            Ide e voltai imitando Pasteur!
                            Ide e voltai imitando Pasteur!
                            E ponto final, por enquanto.

Porto Franco, 1º de Novembro de 1968
Fortunato Moreira Neto  -  Poeta do Sertão."

O armário (guarda-roupa) deixado por João Carlos a dona Dejacyr, sua amiga e auxiliar. Com ele, aprendeu a fazer carne de porco com polenta, um dos pratos preferidos do doutor. 
Dona Dejacyr registrou a esta pesquisa:"O doutor João Carlos podia não acreditar em Deus, mas Deus acreditava nele". Entre armários e situações equivocadas, a condução do contar da história polemiza 
e revela caráteres, caminhos e realismo político.