"Nem todos os anos que passam se vivem:
uma coisa é contar os anos, outra é vivê-los."
(Padre Antônio Vieira)
Myrian Luiz Alves
Manobras militares da Operação Papagaio (setembro-outubro de 1972) em Caiano, em área da propriedade do economista gaúcho Paulo Mendes Rodrigues, primeiro comandante do Dst C da guerrilha. Juca viveu certo tempo na "fazenda", e ali manteve uma farmacinha. O senhor Cícero da Bella lembra-se do jeito de Juca fazer café, aproveitando água quente para escoar copos e xícaras. O Grupo de Trabalho Tocantins gravou relevantes depoimentos a respeito do doutor Juca. Reunidas todas as informações até aqui, o médico nascido há 71 anos em São Leopoldo, presidente da União Gaúcha dos Estudantes em 1964, ano em que se formou na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, contribui para que essa página da história integre o ensino de história do país desde o fundamental. Caiano, às margens do Rio Araguaia, localiza-se em São Geraldo, no sudeste do Pará. Guarda um dos mais fortes e simbólicos registros da memória regional. A foto integra o acervo do ex-soldado Raimundo Pereira de Melo, fundador e dirigente da Associação dos ex-Combatentes da Guerrilha do Araguaia. Nas manobras militares, a base de Caiano era composta, em sua maioria, por soldados vindos de Minas Gerais.
Legal a proposta do blog criado por Taís Morais, jornalista, escritora, pesquisadora da Guerrilha do Araguaia e da história recente do Brasil. Ótima contribuição ao acompanhamento do vaivém da atuante Comissão da Verdade, embora até o momento a presidente da República Dilma Rousseff não tenha nomeado seus integrantes.
Surpresa, também, conhecer, pelo blog, o bonito trabalho postado no Youtube, o dr. Juca (João Carlos Haas Sobrinho) em quadrinhos.
Como sabemos, infelizmente, que a hipocrisia atrasa o contar das histórias, ficamos contentes quando conhecemos novos trabalhos relacionados ao tema. Pois sabemos, por outro lado, que podemos confiar nos condutores do (re) contar. Juca é um deles. O que se passa, né, Taís?
Dr. João Carlos, no Vão do Marco, entre Porto Franco e São João do Paraíso (MA), com o Frei Ângelo e moradores. Abaixo, discurso de Fortunato Pereira Neto, Poeta do Sertão, declamado na despedida do primeiro médico cirurgião de Porto Franco, em meio a 3 mil pessoas, tendo a à frente o então bispo de Tocantinópolis e autoridades locais. Manifestação para o convite a que permanecesse na cidade. Deve-se o arquivo da memória do sul maranhense, em especial, ao secretário de Cultura de Porto Franco, Vaner Marinho e moradores que guardaram lembranças do jovem médico, morto aos 31 anos durante a Operação Papagaio,
ação das três forças militares, na qual tombaram oito guerrilheiros.
Da Memória Sul Maranhense
"Discurso do poeta imortal, Fortunato Moreira Neto, quando do histórico ato público da população de Porto Franco e região, na tentativa de evitar a partida do Dr. João Carlos.
Ilustres
Ouvintes:
Nobres
concidadãos aqui presentes:
Na reunião popular de ontem, fui
surpreendido para fazer uso da palavra. Então, falei, não porque me sentisse em
plenas condições de fazê-lo, mas, circunstancialmente, para dar um simples
haver num grande débito de gratidão. Creio, porém, que o crédito mais aumentou
a importância do débito, o qual sempre há de ficar acima de todos os
pagamentos! E aqui me encontro por causa de tal dívida, por cujo motivo me
cumpre dirigir-vos, em inculta linguagem, expressões e pensamentos, em
referência aos elevados e honrosos objetivos desta impotente e cordial
manifestação de apreço, e condignamente feita, agora, ao Dr. João Carlos,
eminente médico e super-homem que, a serviço do bem, há tempos se encontra
entre nós, como nobre benfeitor da humanidade.
Ora, sabemos que a arte de
falar bem – a mais difícil de todas as artes –, é sublime privilégio de raros
homens chamados gênios, entre os quais posso citar: Demóstenes, na Grécia;
Cícero, na Itália; Dr. Joaquim Nabuco de
Araújo; Dr. Rui Barbosa, o Padre Antonio Vieira (o Crisóstomo); Monte Alverne
e mais outros do Brasil; e todos de renome sobejamente conhecido da História da
Civilização ou na História Universal.
Quisera, meus amigos, ter o
divino dom da Oratória, e para vos dar uma inconcussa prova de leal amizade e
de consideração, neste instante, e sobre o assunto em foco, e que ora tanto nos
empolga e prende a atenção, e por justas
razões.
Um simples palpite de
minha parte quero juntar às vossas mais queridas aspirações, e que deram ensejo
a esta segunda reunião coletiva e seleta, e que significa a continuação dos
nossos melhores anseios pelo completo bem estar e felicidade do bom e heróico
Povo da nossa querida Cidade!
Eis o meu singelo modo de
pensar a respeito da crescente e prosperidade que desejamos a Porto Franco e à
nossa heróica gente e do sertão.
Primeiro que tudo,
devemos apelar para a Suprema Vontade da Providencia Divina, que trouxe o Dr.
João Carlos ao nosso modesto convívio, e para que tão douto e generoso médico
prossiga conosco, como preciosa dádiva do Céu a todos nós, e ante as nossas
dores e sofrimento; segundo, continuarmos constantes no apelo que lhe estamos
fazendo e para que fique conosco, como bem lhe aprouver, ou for conveniente a
seus próprios interesses, e de modo que Deus sempre abençoe a sua honrosa
estadia em nosso meio-ambiente.
Creio ser de nossa
absoluta necessidade termos aqui uma importante Junta Médica, e que lute,
abnegadamente e incessantemente, no sentido de salvar-nos das doenças, e sob o
patriótico amparo da Bandeira do Brasil, heroicamente e hasteada ou desfraldada
entre os suaves e harmoniosos acordes do Hino Nacional a nosso favor.
Da Junta Médica em
pálida e obscura sugestão de um rude Mestre-Escola do Sertão, o Dr. João Carlos
poderá ser o erudito Diretor ou Dirigente, tendo o necessário tempo para
acompanhar a evolução da Medicina Moderna ou da Ciência Médica atualizada; e
para inteira felicidade dos pacatos habitantes de Porto Franco, e de quaisquer
outros lugares que procurarem os relevantes serviços do seu conceituado
Consultório Médico bem esse que nos seja
logo e inadiavelmente dado pela atual Administração do País, em nome de Deus, e
para maior Glória de nossa Pátria estremecida.E, assim, Dr. João
Carlos, mais um mínimo haver no insolvível débito de gratidão que tenho
convosco.
Ide e voltai imitando
Pasteur!
Ide e voltai imitando
Pasteur!
E ponto final, por
enquanto.
Porto Franco, 1º de Novembro
de 1968
Fortunato Moreira Neto -
Poeta do Sertão."
O armário (guarda-roupa) deixado por João Carlos a dona Dejacyr, sua amiga e auxiliar. Com ele, aprendeu a fazer carne de porco com polenta, um dos pratos preferidos do doutor.
Dona Dejacyr registrou a esta pesquisa:"O doutor João Carlos podia não acreditar em Deus, mas Deus acreditava nele". Entre armários e situações equivocadas, a condução do contar da história polemiza
e revela caráteres, caminhos e realismo político.
Um comentário:
Juca doutor João Carlos Haas precisa estar nos livros escolares. Me emocionei com a história.
Mara
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